Durante audiência pública realizada nesta sexta-feira (20), a Juíza de Direito Jaqueline Machado afirmou que não se pode ter medo de discutir gênero, principalmente nos espaços de educação, porque é preciso educar as crianças fora da cultura patriarcal para que os meninos não se tornem não se tornem assassinos de mulheres e que as mulheres não sejam mortas por serem mulheres. 

“Quando a gente fala em gênero, a gente fala em construção de papéis sociais diferentes para meninas e meninos a partir da educação, que hoje fala que os homens têm direito à vida pública, a agressividade, têm direito ao grito. E as mulheres não têm esse direito porque são educadas para o lar, para a docilidade, para a subalternidade e para o cuidado”, afirmou a Juíza.

À frente da 3ª Vara da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Campo Grande, a primeira vara do país especializada em medidas protetivas de urgência, Jaqueline explicou que realiza as audiências de custódia dos homens que são presos em flagrante. “Posso garantir pra vocês que muitos daqueles homens não se tornariam agressores se não tivessem sido educados da maneira como foram”, explicou.

Medidas protetivas
Assim como a Juíza Jaqueline Machado, a Promotora de Justiça, titular da 72º Promotoria de Justiça, na Casa da Mulher Brasileira, Clarissa Carlotto Torres, reforçou a importância das mulheres denunciarem seus agressores e denunciarem novamente caso desrespeitem a medida protetiva. 

“Medidas protetivas salvam vidas. Dos casos de feminicídio consumados e tentados em 2021, 89% das vítimas não tinham medida protetiva. É importante denunciar, inclusive se houver descumprimento de medida protetiva, é preciso fazer a denúncia sobre esse novo crime para que possamos agravar medida com tornozeleira eletrônica ou prisão preventiva”, explicou Clarissa. 

Dados apontam que, atualmente, cerca de 8 mil medidas protetivas estão em vigor em Campo Grande e há 200 agressores usando pessoas usando tornozeleira eletrônica.

A audiência pública “A vida começa quando a violência acaba”, convocada pela vereadora Camila Jara (PT), que é Presidente da Comissão Permanente de Políticas e Direitos das Mulheres, de Cidadania e Direitos Humanos e Procuradora na Procuradoria Especial da Mulher da Câmara Municipal de Campo Grande, reuniu diversos nomes da luta pela igualdade de gênero e pelos direitos das mulheres.

Também participaram do evento a Coordenadora de Projetos Sociais do IAPPEC – Instituto de Apoio Proteção Pesquisa Educação e Cultural e Fundadora da Escola de Mãe Luz, Silvia Tavares Farina; a Conselheira do Conselho Municipal de Direitos da Mulher, Coordenadora de Projetos e Ações Temáticas da Subsecretaria de Políticas para a Mulher de Campo Grande, Marcia Paulino; e os vereadores Edu Miranda e Professor André Luis, que secretariou a audiência pública.

Namoro sem violência
Para atender a demanda levantada durante a audiência pública, está em tramitação na Câmara Municipal o Projeto de Lei nº 10.212/21, que prevê a criação da Campanha Municipal Namoro sem Violência, a ser realizada anualmente junto às ações do “Agosto Lilás”.

A ideia é que educadores da rede municipal de ensino sejam capacitados e abordem em sala de aula temas relacionados à violência nas relações afetivas, impulsionando a reflexão crítica sobre a violência contra a mulher e sensibilizando e mobilizando a juventude a discutir esse fenômeno e propor práticas preventivas e de intervenção prévia, visando a uma mudança comportamental.

Além disso, a campanha pretende disseminar a Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) e o conhecimento sobre a necessidade do registro, nos órgãos competentes, das denúncias dos casos de violência contra a mulher, bem como da adoção das medidas protetivas previstas na Lei Federal 11.340/2006.

“Essa é mais uma política pública que visa prevenir a violência contra a mulher por meio da educação, em vez de esperar que ela aconteça para só então agirmos. Precisamos combater a naturalização e a romantização de alguns tipos de violência, como o excesso de ciúmes, a perseguição, entre outras tão comuns nos namoros. Quando a violência se instala no cotidiano das relações afetivas durante a adolescência, seus efeitos sobre o desenvolvimento dos valores, padrões e hábitos das mulheres são devastadores. Futuramente, esses jovens se tornam adultos inseguros e que banalizam a violência nos relacionamentos afetivos e familiares”, explica Camila.

Para elaborar o projeto, a equipe se inspirou em um projeto homônimo idealizado pela pedagoga Alessandra Coelho e implantado no estado do Amapá em 2017. Iniciativa semelhante também já foi realizada pelo Núcleo de Gênero do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que elaborou e distribuiu para adolescentes uma cartilha composta de sete dicas para identificar atitudes dominadoras do parceiro e impor limites para que esta situação não evolua para uma agressão física, psicológica ou sexual.